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A ansiedade nossa de cada dia

Por Fabiana Tessaro - 

Difícil não estar ansioso hoje em dia, eu digo isso porque a ansiedade faz parte do mundo contemporâneo. Somos cobrados a todo momento, temos que ser felizes, temos que ser bonitos, temos que ser magros, temos que ter dinheiro, dar resultados, ter sucesso, saúde, amor e por aí vai.

A ansiedade tem a ver com controle, com a busca pela perfeição, com a responsabilidade, com o desejo de que nada pode dar errado, de não sofrermos frustrações, eu não posso errar, onipotência, como se fossemos capazes de controlar tudo isso.

Agora se nós já convivíamos com a ansiedade, o que dizer sobre esse momento tão inédito, tão único, parece que estamos em um filme ou em uma dessas séries da Netflix, quando que nós imaginamos por uma pandemia? Que um vírus seria capaz de mobilizar o mundo? Que nos tiraria a liberdade de ir e vir, que nos impediria de conviver com a família, amigos, que nos paralisaria, privação! Demonstração de amor hoje em dia é não ter contato físico, para nós brasileiros, isso seria impensável.

Estudos recentes mostram um crescimento considerável de casos de depressão e ansiedade. Estamos passando por uma crise sanitária, política e diante de todos esses acontecimentos como fica nossa saúde mental? Cada um de nós terá uma história diferente para contar, iremos atravessar esse mesmo momento de uma forma singular, ninguém é igual a ninguém, somos seres únicos.

Mas o que é a ansiedade?

A ansiedade é um afeto, é uma emoção que está presente em todos os seres vivos. Ansiedade se traduz em medo, ansiedade é um excesso de futuro, expectativa. Um animal também sente ansiedade, mas neste se dá uma descarga motora, ao avistar um perigo uma decisão deve ser tomada, fugir ou atacar. A ansiedade é um alerta, um aviso de perigo, alguma medida deve ser tomada. É um medo muito primitivo, o medo de não existir, o medo de ser aniquilado, o medo de morrer e isso é muito sofrido e angustiante.

Para nós seres humanos a ansiedade ativa a função do pensar e quais são os pensamentos automáticos diante dessa situação atual: tragédia. Eu estava estabelecida, tinha minhas rotinas, eu tinha planos, com a construção simbólica de proteção estruturada, Deus, família, trabalho, dinheiro. De repente o chão se abre, um buraco, será que eu vou ter trabalho, até quando meu dinheiro vai durar, meu corpo, minhas roupas, minha imagem. Sim, eu vou me contaminar, alguém da minha família vai se contaminar, será que eu vou sobreviver? Se eu não for contaminado, eu vou passar fome, a comida vai acabar, crise social, crise política, o sistema de saúde vai colapsar, guerra, morte, caos. Se algum leitor aqui não se sentir ansioso, muito provavelmente ativou aí um mecanismo de defesa que julgo não ser o melhor, a negação. A ansiedade em algum grau, é positiva, pois se é um alerta, o que eu faço com isso aqui e agora, eu preciso me proteger, eu preciso fazer algo.

E quando ela é patológica? Quando ela é muito intensa, quando ela dói no corpo, é um aperto no peito, falta de ar, palpitação, irritabilidade (eu vou matar meu marido ou minha mulher, eu não sei lidar com os meus filhos 24 horas por dia!). O corpo é tomado por cortisol e adrenalina e se prepara para o embate, mais oxigênio e sangue nos músculos, estou pronto para a guerra.

Estamos lutando contra um inimigo invisível, uma ameaça constante, em potencial. Nos noticiários só se vê o caos, sim, minha mente e meu corpo se preparam para a guerra 24 horas por dia, e assim temos impulsos dos mais variados, como comer tudo o que aparecer pela frente, aumento do consumo de álcool, fazemos sem pensar, um pequeno prazer para apaziguar o sofrimento. Mas a notícia boa é que existem outras formas para lidarmos com isso.

Se eu pudesse sugerir algo, eu diria, não censure suas emoções, não lute contra seus sentimentos com coisas do tipo, eu não posso sentir isso ou aquilo, se há angústia, o medo e a preocupação são reais. O que eu proponho aqui é “pensar o pensamento”, como dizia nosso grande mestre Wilfred Bion. Os pensamentos se apresentam, quando você menos espera, eles já estão lá instalados. Pensar o pensamento, de uma forma muito simplista, é ampliar o que se pensa, é considerar outras possibilidades. Suportar esse vazio, talvez pensar como tudo isso pode se tornar interessante, porque não existe possibilidade de não sairmos transformados, toda experiencia gera uma transformação, não existe receita, cada um terá que encontrar sua forma.

É momento de nos responsabilizarmos, mas de uma forma amorosa, ter auto compaixão, respeitar o que se sente, nós não sabemos mesmo o que vai acontecer e algum dia alguém soube? Sustentar esse vazio do não saber e talvez, talvez usar isso como uma brecha para criar. Uma mente poluída não cria, só reage. Uma mente poluída, paralisa, não há espaço para pensar, é catastrófica.

Nenhuma realização corresponde na sua totalidade com a expectativa, então usemos isso também para pensar quando antevemos uma tragédia, deixemos uma brecha para o acaso, para as surpresas boas que podem ocorrer no meio do caminho, uma vacina, um projeto que estava na gaveta, um amigo, um milagre.

Que tal deixarmos uma pequena dose de realidade, do dia a dia, organizar nossa vida, se chegamos aqui é porque temos recursos dentro de nós para lidarmos com isso. Enquanto isso, leia aquele livro que ficou na estante esquecido, veja os filmes novamente que você tanto gosta, por que não? Converse com seus amigos, fale do que sente, está tudo bem, está tudo bem não ser perfeito (a propósito, isso existe?), está tudo bem fracassar!!!