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Por Jose Claudio de N. Gonçalves -
O fim do século XIX na Europa foi marcado por escândalos políticos, inquietação social e conflitos, mas também foi uma época de grande progresso social e científico. Nesse campo, em 1983 Breuer e Freud publicam em periódicos médicos quase que simultaneamente em Berlim e Viena o texto conhecido como “Comunicações Preliminares”, onde expõem as conclusões que haviam chegado até então resultantes das experiências terapêuticas que conduziam a partir do que conheciam do trabalho de Charcot em relação ao tratamento dos sintomas histéricos.
Buscando ratificar a teoria de que um trauma estaria na raiz desses sintomas e convencidos de que as circunstâncias desse trauma seriam determinantes nas características desses sintomas buscavam desvendar em suas pacientes os traumas causadores de suas aflições. Entretanto esbarravam no empecilho da memória que poderia acessar esse trauma; nem sempre disponível, nem sempre acurada, frequentemente falha. Inspirados no trabalho de Charcot recorrem a hipnose como um instrumento de ampliação da mente, acreditavam então que com ela chegariam - através de um relato fidedigno e sem a interferência crítica da mente consciente - ao trauma do passado culpado pelo quadro histérico atual. Isolavam cada sintoma e procuravam através desse retrocesso hipnótico na história do paciente saber quando ele apareceu pela primeira vez e concluíram que havia um acontecimento (físico ou psicológico) emocionalmente traumático relacionado `a maioria dos sintomas histéricos. Era o chamado método catártico.
Freud levantou a hipótese de que existiria algo que chamou de “soma de excitação” que participaria de um processo análogo ao de uma “contabilidade” da energia psíquica; postulava que a energia psíquica teria sua quantidade alterada por acontecimentos ou ações das pacientes e acreditava que a mente procuraria manter sua homeostasia controlando a quantidade presente dessa unidade: se essa soma de excitação fosse aumentada por um trauma deveria ser forçosamente diminuída por uma ação/reação a esse trauma. O aumento se daria sempre por vias sensoriais e a diminuição necessariamente por vias motoras. Quando nenhuma re-ação a um trauma fosse possível a lembrança desse trauma permaneceria ligada ao afeto que este originou. Os pacientes histéricos sofreriam consequentemente de traumas psíquicos que não sofreram ab-reação (essa descarga emocional onde o indivíduo se liberta do afeto que acompanha a recordação de um trauma) ou a sofreram de forma incompleta.
Precisavam, no entanto, de um local psíquico onde esse trauma que não poderia ser lembrado (dado ao afeto a ele ligado) pudesse ficar. Acreditaram estarem lidando com um fenômeno que chamaram de “consciência dupla” e que a própria histeria estaria ligada `a um tendência pessoal `a essa divisão da vida psíquica entre a consciência propriamente dita e um local interditado ao acesso onde a memória do trauma residiria, um estado anormal da consciência que chamaram de “hipnoide”. Futuramente seria chamado de inconsciente. A premissa do tratamento proposto era quase linear: forçar com a hipnose a lembrança do acontecimento traumático reagindo ao mesmo através da fala, livrando-se do afeto associado `a representação do trauma e com o término dessa associação haveria a extinção do sintoma causado por ela.
Freud acreditava que a etiologia dos sintomas histéricos estaria obrigatoriamente em acontecimentos traumáticos dentro da esfera sexual do paciente; no caso específico da histeria o trauma seria causado por experiências de passividade sexual ocorridas no período pré-sexual. Propôs então o que foi chamado de teoria da sedução.
Na teoria da sedução Freud divide a culpa da histeria presente entre dois acontecimentos do passado do paciente. O primeiro acontecimento seria o já mencionado trauma de origem sexual onde o paciente teria sido abusado sexualmente com uma postura passiva ainda na sua primeira infância (pré-sexual), quando não teria compreensão real do que de fato teria ocorrido. O segundo acontecimento se daria já após a puberdade, seria de ordem sexual ou não, mas necessariamente remeteria `a memória do primeiro acontecimento originando um afeto que não seria suportado pela consciência. A memória causadora desse afeto consequentemente precisaria ser deslocada para aquela outra metade “hipnoide” da consciência, ou recalcada.
Alguns anos depois Freud percebeu que cometera um equívoco no desenvolvimento de sua teoria, mencionando em uma carta a Fliess (#59) os motivos de sua decepção: dificuldade de chegar ao evento traumático inicial, a necessidade improvável de pensar em qualquer adulto como um perverso e finalmente o pontapé inicial do que foi sua grande descoberta nesse processo, a teoria da fantasia histérica: “[…] no inconsciente não existe um signo de realidade de modo que não se pode distinguir a verdade da ficção investida com afeto”. Freud não soube diferenciar as fantasias de seus pacientes em relação `as suas infâncias das recordações de experiências reais e acabou atribuindo `a sedução uma importância e universalidade etiológica que na verdade ela não possuía. Esse desapontamento abre caminho para Freud questionar a validade do método catártico com o qual tinha tratado, com pequenas variações, todas as formas de histeria até então.
Ao avançar no desenvolvimento da sua teoria da fantasia Freud chega à conclusão de que nem sempre houve um acontecimento traumático real no passado originando a histeria. A “sedução” que originou o trauma poderia ter sido o produto de fantasias originadas em um período posterior e que foram projetadas para o passado, despertando em Freud o conceito de que existiria uma realidade psíquica própria de cada paciente que não era um espelho fiel da realidade externa ao mesmo.