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Sexualidade infantil na psicanálise

Sexualidade infantil na psicanálise

Por  Willian Fausto Lourenço - 

No início da teoria metapsicológica de abordagem do inconsciente (a primeira tópica), Freud compreendia o aparato psíquico conformado por três áreas topográficas (modelo territorial): 1. Consciência: lugar de memórias e emoções atuais, onde se “toma” decisões estando em contato direto com o mundo externo; 2. pré-consciente: lugar de conteúdos ora conscientes ora inconscientes, como por exemplo muitas das memórias que mencionamos antes, pois só se fará consciente quando necessário for e logo voltará a ser inconsciente; e 3. Inconsciente: a princípio, o que não é capaz de ser consciente. 

Depois, Freud entende o inconsciente como sede do reprimido onde parte dele poderá vir para a consciência de maneira disfarçada. 

De modo sintético, nessa primeira tópica, Freud postulava que conteúdos reprimidos ao inconsciente foram resultado de uma cena traumática, geralmente um abuso incestuoso, e/ou por desejos em relação às figuras parentais. Além disso, o inconsciente na primeira tópica é o reprimido da consciência para o inconsciente e exige um gasto constante de energia (a censura) para mantê-lo inconsciente.

Ao passo que seus estudos foram sendo aprimorados e noções de fantasia, desejo sexual da criança em relação aos pais, sonhos, transferências, resistência, entre outros, novos aspectos foram agregados à teoria. Assim que, Freud obteve outras compreensões do conteúdo inconsciente colocando o ponto central do reprimido nos complexos de castração e de Édipo. A partir dessa concepção, vai-se conformando a segunda tópica do aparato psíquico como um funcionamento mais dinâmico e não tão geográfico como na primeira tópica. A grandes pinceladas, na segunda tópica o aparato psíquico é visto como qualidade e não como lugar.

Ademais, mesmo não abandonando por completo a primeira tópica, Freud reformula sua teoria subdividindo o aparelho psíquico em instancias dinâmicas que se interagem: o Eu, o Supereu e o Isso (ou Ego, superego, id). Não será preciso caracterizar e discorrer sobre estas instâncias porque já foi feito em trabalhos anteriores. No entanto, para compreender as proposições da segunda tópica, é necessário irmos ao famigerado complexo de Édipo.

No início da formação psíquica, tanto o menino quanto a menina têm como objeto de amor a mãe e ambos se percebem sem sexo pois as zonas erógenas ainda não estão entendidas como órgão sexual. Com o passar do tempo, o menino percebe que a menina não tem o pênis que ele tem; e a menina, a sua vez, se dá conta que o menino tem pênis e ela não. O menino lida com o horror da possibilidade de ser castrado pois a menina já foi; e a menina com a fantasia de que o seu pênis crescerá.

Em algum momento o objeto de amor toma novos direcionamentos. O menino duela com o pai pelo amor da mãe, mas percebe que o pai tem um pênis maior e mais poderoso que o seu. A menina rivaliza com a mãe e deseja o amor do pai pois esse sim poderá dar o pênis que ela não tem. Resumidamente, a menina tem inveja do pênis e se vê castrada e o menino tem medo de ser castrado.

Todo esse movimento é chamado de complexo de castração (medo de ser castrado no menino e se perceber castrada na menina) e complexo de Édipo (menina deseja o pai que lhe dará o pênis faltante e o menino deseja a mãe mesmo com medo de perder o pênis que tem).

O complexo de Édipo é dissolvido no menino quando o medo de ser castrado é eliminado ao entender que não deve seguir desejando a mãe pois esse desejo é o que poderá leva-lo à castração. De maneira distinta, a menina é introduzida no complexo de Édipo pelo complexo de castração (sabe que perdeu o pênis e vai atrás do pai). No entanto, quando o menino entende que não perderá o pênis e a menina aceita que nela não vai crescer, o complexo de Édipo se dissolve. Embora Freud não deixa o complexo de Édipo totalmente resolvido na menina pois ele acredita que só realmente dissolverá quando ela tiver o filho que o pai não lhe deu. Ou seja, a maternidade é o fim do Édipo da menina.

Como estamos falando a partir da estrutura psíquica neurótica, é necessário ressaltar que os desejos em relação às figuras parentais que deverão ser reprimidos pois são desejos incestuosos como dita nossa cultura. Para que isso aconteça o pai, como função ou pessoa física, agirá de maneira a fazer-se entender que é impossível desejar o pai ou a mãe. Se instaura a noção de lei moral e os desejos presentes no complexo de Édipo são reprimidos. Essa repressão conforma uma instância do aparelho psíquico que tem parte conscientes e inconscientes: o Superego. Como já vimos, o superego se forma de maneira distinta no menino e na menina porque é o resultado do complexo de castração e do complexo de Édipo. Em poucas palavras e teoricamente, os complexos mencionados vão garantir a introjeção de leis morais e códigos narrativos estabelecidos pela sociedade onde as crianças nascem. Embora todas essas vivências sexuais infantis são reprimidas sempre aparecerão de maneira disfarçada na vida, escolhas e comportamento repetitivo do neurótico.

Como vimos, o centro de toda teoria psicanalítica e formação neurótica para Freud na segunda tópica afasta-se de um trauma infantil e é deslocado para um complexo incestuoso estando totalmente conformada ao redor do pênis, bem como, sua presença ou ausência. Outra importância que Freud dá são aos sentimentos de insatisfação, rebelião à ordem biológica e social, ambivalências como amor-ódio e prazer-desprazer, vingança, disputa, frustração, medo de perder, rivalidade que são experimentados já em tenra idade. O complexo de Édipo é uma espécie de fracasso por não obter as figuras desejadas e êxito pela formação do superego.

Um outro tema, sempre presente na obra Freudiana, é a noção de perversão como toda prática sexual que não cumpre a ordem biológica do coito realizado entre homem e mulher rechaçando assim a fidelidade à copulação. De aí nasce as perversões com base no narcisismo infantil e seus desdobramentos: masoquismo, sadismo e sadomasoquismo. Curioso que ao evoluir em sua teoria, Freud, nos artigos finais, já começa a admitir uma certa normalidade na perversão. Um exemplo é o fetichismo, uma organização sexual na qual a satisfação só é possível na presença e uso de um outro objeto. Freud encara esta possibilidade como um substituto do pênis que falta na mãe pelo homem e como recusa à castração biológica pela mulher.

Para finalizar, percebo Freud, nesse momento, fazendo uma separação entre a noção de sexual, mais ligado à sexualidade infantil e os seus movimentos libidinais já relados, e sexualidade, sentido mais amplo admitindo-a como parte do funcionamento do próprio aparelho psíquico a partir do princípio de prazer. Nessa nova ordem de pensamentos em gestação, o que se refere ao sexual é tido como uma tensão dentro do aparelho psíquico em busca de satisfação ou diminuição da excitação. Desta maneira, estamos no campo da pulsão de morte relacionada à descarga de tensões com intenção de eliminá-la completamente (isso como ideal, pois a descarga da excitação nunca será completa ou eliminada). Evidente que a sexualidade dentro dessas tensões e descargas está concatenada com os destinos da pulsão de morte que tende à eliminação total dessa excitação seja dentro do complexo de Édipo ou nas experiências de descargas pulsionais post-Édipo ao longo da vida.